Entrevista a Bert Hellinger,
Criador da psicoterapia de constelações familiares
Por Victor M. Amela.- 15/10/2009
"Se tens a tua mãe bem integrada em ti, brilharás!"
Bert Hellinger.
Tenho 83 anos. Nasci na Alemanha, e aí vivo. Viajo por todo o mundo para dirigir oficinas de constelações familiares. Estou casado. Não tenho filhos. Não falo de minhas idéias políticas nem de minhas crenças: em que poderia ser útil isso a alguém?
BH.: A mãe é a conexão à vida
P.- Que se lembra de sua mãe?
BH.: Pode informar-me antes sobre que assuntos lhe interessam tratar nesta entrevista?
P.-De sua psicoterapia. Mas, antes, um pouco de sua vida.
BH.- Minha vida? Melhor falar de assuntos úteis para seus leitores, mais que de circunstancias de minha biografia.
P.- De acordo, mas acredito que conhecer sua vida pode ajudar a entender seu método. ...
P.- Que se lembra de sua juventude durante o nazismo? ...
P.- Tenho lido que o catolicismo de seus pais lhe blindou daquela barbárie.
BH.- Proponha um tema, e centremo-nos nisso.
P.- De acordo: a mãe. Sustem que a figura materna molda nossa psique.
BH.- A mãe está no fundamento da nossa felicidade!
BH.- Se estiveres em boa conexão com tua mãe, brilharás.
P.- Brilharás?
BH.- Se um tem bem integrado psiquicamente a sua mãe, irradiará alegria, a gente o amará, triunfará em sua vida, brilhará...
P.- Pois por isso lhe pergunto por sua mãe.
BH.-Se amarmos a nossos pais tal como são, se dizemos "sim" ao que são e, sobre todo, se estamos contentos de que nos parira nossa mãe, brilharemos de felicidade!
P.- Você foi sacerdote católico, missioneiro entre os zulus durante 16 anos... ...
P.- Que apreendeu aí?
BH.- Jamais vi uma criança zulu desrespeitosa com seus pais, com os mais velhos, seus antepassados... Seria inconcebível para um zulu falar mal de seus pais!
P.- Deixou você o sacerdócio católico ao fazer-lhe alguém certa pergunta... ...
"Que é mais importante para você: teus ideais ou as pessoas?", lhe perguntaram.
Refletiu e regressou a Europa faz 30 anos para formar-se em psicoterapia.
BH.- Não falo de mim: não é tema. Pergunte-me algo que seja útil aos que leiam isto, por favor.
P.- Ideou um método psicoterapêutico: as constelações familiares. Que é isso?
BH.- Está disposto a escutar coisas que possam parecer algo esquisitas?
P.- Não será a primeira vez, não tema.
BH.- Quando alguém tem um bloqueio, um conflito, um nó, e quer abordar-lo para resolver-lo, eu o coloco no cenário do talher de psicoterapia, ou bem coloco a alguém dos presentes para que lhe represente...
P.- Embora não se conheçam entre eles?
BH.- Embora não se conheçam, nem ainda o representante saiba nada do representado.
P.- E o que sucede então?
BH.-Que o representante faz algo, olha à algum lado, se move... Se olhas ao chão, está vendo a alguém morto, quer morrer... Coloca aí a outra pessoa que represente ao morto. Os movimentos se sucedem e vão expressando o conflito...
P.- Que mecanismo está operando aí?
BH.- Não busque explicação científica. O certo é que aí se manifestam as forças que nos transpassam. A cada representante lhe invadem as emoções dos representados, o conflito se manifesta nesses movimentos imprevisíveis.
P.- E que papel desempenha você?
BH.- Nenhum. Só sento e observo o que sucede. A figura da mãe é representada sempre em algum momento. Não necessito perguntar, só vejo que passa. No caso de pessoas com fracassos em sua vida pessoal e profissional, sempre é o mesmo: desconexão com a mãe!
P.- Sim?
P.- E pode isso reparar-se?
BH.- Pode. Freqüentemente se reencontra com a mãe, se abraçam, respiram fundo... Têm-se re-conectado! Esses movimentos têm unido o que estava separado.
P.- Nossos fracassos e infelicidade vêm de excisões com a mãe?
BH.- Sim. Muitos empresários fracassam porque reproduzem com sua empresa a mesma relação de rejeição que mantém com a mãe.
P.- E que pinta o pai em tudo isto?
BH.- A mãe nos conecta à vida e o pai nos conduz à vida social.
P.- Que passa com o recém nascido cujos pais se separam?
BH.- Se os pais acordam seguir desempenhando suas respectivas funções de pai e mãe, nada grave.
P.- E se a mãe menospreza a figura do pai ante o filho?
BH.- Se uma mãe menospreza a ou furta a figura do pai, incapacita a seus filhos para o êxito social e semeia em seus filhos uma raiva... que, um dia eles lhe devolverão.
P.- Porque existe hoje tanta criança tirana?
BH.- Tem visto a um menino de dois anos agressivo?: Há absorvido a raiva que sua mãe não assumiu por um aborto... Às vezes o menino capta que papai ou mamãe não quer viver, e é agressivo para atrair sua atenção para a vida.
P.- Porque tantas mulheres assassinadas?
BH.- Vítimas dos homens por centúrias, as mulheres hoje miram aos homens com raiva acumulada... e alguns homens reagem criminalmente a essa mirada.
P.- Aconselhe a uma garota a ponto de parir.
BH.- Desejas parir de verdade? Ou só que te tirem ao neném sem te dar conta? Anestesia e cesárea furtam ao neném sua primeira oportunidade de lutar e sua grande ocasião de obter uma vitoria nesta vida. Poderá uma criatura com este começo impor-se logo na vida e triunfar? Difícil, difícil...
Apontes de Constelações Familiares:
O bom e o mau. Quem é quem?
Há mandatos sociais. Há, em teoria, coisas que se devem fazer e outras que NÃO se devem fazer. Estão os chamados bons e os chamados maus. Estão os que recebem aplausos e os que são sinalados pelos demais. Minha pergunta é: Quem tem a razão? Outra pergunta: Quem é o bom e quem é o mau?
Graças ao trabalho e ao aprendizado que tenho tido a sorte de ver e ter com Constelações Familiares, cada vez me paro menos a pensar nos bons ou os maus das histórias. Cada vez há menos juízos ante o que faz um ou outro. Cada vez há menos pessoas marcadas.
Trato de contemplar cada história com olhos bem abertos e sem deixar-me de maravilhar do grande que é o balanço e a compensação em cada grupo, e de como se cumpre uma e outra vez, especialmente, quando alguém fica excluído da família.
Do lado do “mau”
Quando me contam uma história de alguém “mau”, uma pessoa que se comporta “mal”, uma pessoa que faz “o pior”, um ser humano que “se sai do estabelecido”, meu primeiro pensamento é: A que pessoa de sua família estará representando? Com quem estará embrulhado? De onde provém este suposto mal?
Neste ponto me lembro de Carola Castillo, quem em nossa formação costumava dizer-nos algo assim como que quando lhe mostravam ao bom e ao mau, ela se sentava ao lado do mau, pois quiçá os supostos bons eram mais numerosos e quiçá fazia falta alguém que se sentara junto ao suposto mau, o olhara e lhe dera um lugar.
E é o que regularmente, fazemos com os maus? Os excluímos, os sacamos de nossa vida, os execramos da família, lhes deixamos de falar. E aí começa ou segue o desequilíbrio, dependendo da história.
Por exemplo, se vemos a dois irmãos: um deles trabalha, estuda, é responsável, não se mete com ninguém. O outro é alcoólatra, enfermo, quiçá rouba ou é adicto. Quem é o bom? Resposta rápida: o que não se mete com ninguém. Quiçá o outro seja o excluído, sinalado, execrado, porque é o mau.
Na teoria de Constelações Familiares, quando se trata dos irmãos, se diz que entre eles, sem importar a quantidade, se reparte (por assim dizer-lo), os temas da família, tanto os bons como os menos bons. Sem embargo, pode passar que um deles, geralmente o maior, tome uma maior carga dos problemas; desta maneira, os outros irmãos quedam com menos carga, mais leves.
O anterior, ainda soe estranho, termina sendo um ato de amor, de lealdade. “Por ti, irmão e por minha família, tomo esta carga. Deixo mais leve você, mais livre”. “O tomo eu antes que o tome você”, seriam as palavras do irmão maior.
Com esta mirada e tomando o caso anterior, vale perguntar-se de novo: Quem é o bom e quem é o mau? Quem o faz melhor e quem o faz pior? Quem paga o preço mais alto?
Olhar, assentir e honrar
Baixo esta perspectiva e com o exemplo anterior, há dois aspectos importantes a tomar em conta.
O primeiro, que o irmão “bom”, possa mirar e reconhecer a seu irmão “mau”. Que possa assentir, ainda sendo doloroso, a esse destino. Que possa mirar que graças a esta carga, ele está um pouco melhor. Às vezes é difícil, especialmente, quando há medo, dor, raiva e incluso pode haver uma pergunta intrínseca: Que acontece que eu estou “bem” e meu irmão estão “mal”.
Pode também se dar o seguinte pensamento: “Eu quero que meu irmão esteja bem”. E detrás desta frase há um desrespeito ao destino do outro. Não se reconhece sua carga e se lhe critica. É paradoxal e é o que sinala a teoria de Constelações Familiares.
A mirada que brinda solução entre estes dois irmãos é que o que está “bem” possa mirar e honrar o seu “irmão mau”, que possa assentir a seu destino. “Irmão, agora posso mirar-te e posso mirar o que fazes por mim. Honro teu destino, com amor e dor. E farei o melhor que possa com minha vida. Graças por tomar esta carga por mim e por nossa família”, puderam ser suas palavras de resolução.
Com esta resolução, não só pode trocar a relação entre estes dois irmãos, senão também pode evitar as repetições nas seguintes gerações.
Sair do embrulho
Pessoalmente, acredito que assentir ao destino dum ser amado pode ser difícil e incluso doloroso, especialmente tratando-se dum destino com mais carga. Como assentir ao câncer dum familiar? Como dizer SIM a um acidente dum ser querido? Como honrar o destino dum adicto ao que amo?
O anterior requeira de força, de valentia, de dignidade. É um desafio à arrogância, a nossa necessidade de querer cambiar o que lhe sucede ao outro e só olhar-lo sem intenção.
Agora bem, como dizia ao princípio deste texto, ao olhar um caso de vítimas e perpetradores, trato de observar quem falta e a quem poderia estar representando o cliente o que pode estar olhando o que os demais membros de sua família não vêem.
Imaginemos o mesmo “irmão mau”, o que está enfermo, é adicto ou alcoólatra. Este poderia estar imitando o destino de um perpetrador de sua família ou poderia estar fazendo acerto por uma vítima de sua família que foi excluída pela dor.
Uma solução possível para o sistema está em trazer à constelação uma vítima e seu perpetrador da família com a que trabalhamos. Sem importar necessariamente a geração com a que trabalhemos, ou se temos a informação exata do que sucedeu nessa família.
Só quando a vítima e seu perpetrador possam encontrar-se, o sistema terá um pouco mais de paz. E esta pessoa, embrulhada em seu sistema, terá um pouco mais de liberdade para escolher o que decida desde outro lugar, com menos carga.
“Agora posso mirar-los. Junto em meu coração e em minha alma a todas as vítimas e perpetradores de meu sistema. Não posso fazer nada por vocês, é muita carga para mim. Por favor, olhem com carinho se o faço diferente a vocês, se deixo de ser o perpetrador ou a vítima, se sou um pouco feliz. Por favor.”
Cada família é perfeita. Cada qual faz o melhor que pode com seu destino. Às vezes a carga é mais pesada, às vezes mais leve. E sempre estamos unidos aos nossos, mais além de quem seja o bom ou o mau. Todos cabem. Todos têm um lugar.
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