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quarta-feira, 29 de agosto de 2012
A VOLTA DE MARTÍN FIERRO
Capítulo XXXII
Um pai que nos dá conselhos
Mais que um pai é um amigo;
Assim como tal lhes digo
Que vivam com precaução:
Ninguém sabe em que rincão
Se oculta quem é inimigo.
Eu nunca tive outra escola
Que uma vida desgraçada:
Não estranhem se na jogada
Alguma vez faço errado,
deve saber muito pouco
quem nunca aprendeu de nada.
Há homens que de sua ciência
Tem sua cabeça cheia;
Há sábios de todas as veias,
Mas eu digo, sem ser douto:
É melhor que aprender muito
O aprender coisas boas.
Não aproveitam os trabalhos
Se não tem a ensinar-nos nada;
O homem, duma mirada,
Tudo há de ver ao momento:
O primeiro conhecimento
É conhecer quando enfada.
Sua esperança não a bote
Nunca em coração nenhum;
No maior infortúnio
Ponham sua confiança em Deus;
Dos homens, só em um,
E com precaução em dois.
As faltas não têm limites
Como os têm os terrenos;
Encontram-se nos melhores,
E é justo que lhes avise:
Aquele que defeitos tenha,
Dissimule os alheios.
Ao que é amigo, jamais,
o deixem na estacada,
Porém não lhe peçam nada
Nem aguardem tudo dele:
Sempre o amigo mais fiel
É uma conduta honrada.
Nem medo nem a cobiça
É bom que a você lhe assaltem;
Assim, não se sobressaltem.
Pelos bens que pereçam;
Ao rico nunca lhes ofereçam
E ao pobre jamais lhe faltem.
Bem o passa, até entre pampas,
O que respeita à gente;
O homem há de ser prudente
Pra se livrar da ira:
Cauteloso entre os frouxos,
Moderado entre valentes.
O trabalhar é a lei,
Porque é preciso adquirir;
Não se exponham a sofrer
Uma triste situação:
Sangra muito o coração
Daquele que tem que peder.
Deve trabalhar o homem
Para ganhar seu pão;
Pois a miséria, em seu afã.
De perseguir de mil modos,
chama na porta de todos
E entra na do preguiçoso.
A nenhum homem ameacem,
Porque ninguém se acovarda;
Pouco em conhecê-lo tarda
Quem ameaça imprudente:
Que há um perigo presente
e outro perigo que aguarda.
Para vencer um perigo,
Salvar de qualquer abismo
-Por experiência o afirmo-,
Mais que a espada ou a lança
Pode servir a confiança
Que o homem tem em si mesmo.
Nasce o homem com astucia
Que há de servir-lhe de guia;
Sem ela sucumbiria:
Porém, segundo experiência,
Se volve em uns prudência
E nos outros picardia.
Aproveita a ocasião
O homem que é diligente;
E, tenham-o bem presente:
Se ao compará-la não erro,
A ocasião é como o ferro:
Deve-se bater em quente.
Muitas coisas perde o homem
Que às vezes as volta a achar;
Porém lhes devo ensinar,
E é bom que sempre o lembrem:
Se a vergonha se perde,
Jamais se volta a achar.
Os irmãos sejam unidos
Porque essa é a lei primeira;
Tenham união verdadeira
Em qualquer tempo que seja,
Porque, se entre eles se peleiam,
Os devoram os de arreda.
Respeitem aos idosos:
O burlar-os não é façanha;
Se andam entre gente estranha
deverão ser precavidos,
Pois por igual sempre é tido
Quem com os maus se acompanha.
A cegonha, quando é velha,
Perde a vista, e procuram.
Cuidar-la na idade madura
Todas suas filhas pequenas:
Aprendam das cegonhas
Esse exemplo de ternura.
Se lhês fazem uma ofensa,
Ainda a joguem ao olvido,
Sejam sempre prevenidos;
Pois certamente sucede
Falará mal de vocês
Quem os tiver ofendido.
Quem desobedecendo vive
Nunca tem sua sorte branda,
Mas com sua soberba aumenta
O rigor que ele padece:
Obedeça ao que obedece
e será bom ao que manda.
Procurem não perder
Nem tempo nem a vergonha;
Como todo homem que pensa,
Procedam sempre com juízo;
e saibam que nenhum vicio
Acaba onde começa.
Ave de bico encurvado
Tem pelo roubo afeição;
Porém homem de razão
Não rouba jamais um cobre,
Pois não é vergonha ser pobre
E é vergonha ser ladrão.
O homem não mate ao homem
Nem brigue por fantasia;
Tenha na desgraça minha
espelho para mirar-se;
Saber o homem guardar-se
É grande sabedoria.
O sangue que se derrama
Não se esquece até a morte;
A impressão é de tal sorte,
Que, a meu pesar, não o nego,
Cai como gotas de fogo
Na alma de quem a verte.
É sempre, em toda ocasião,
O trago o pior inimigo;
Com carinho se os digo,
E lembrem-se com cuidado:
Aquele que ofende bebido
Merece duplo castigo.
Se se arma algum revoleio,
Procurem serem os primeiros,
Não se mostrem altaneiros,
Embora razão lhes sobre:
É na barba dos pobres
Onde aprendem os barbeiros.
Se entregam seu coração
A alguma mulher querida,
No façam uma partida
Que ofenda aquela mulher:
Sempre os há de perder
Uma mulher ofendida.
Procurem, se são cantores,
O cantar com sentimento,
Não afinem o instrumento
Só pelo gosto de falar,
E acostumem a cantar
Em coisas de fundamento.
E lhes dou estes conselhos
Que me há custado adquirir,
Porque desejo dirigi-los;
Porém não alcança minha ciência
para dar-lhes a prudência
Que precisam para segui-los.
Estas coisas e outras muitas
Meditei em minhas solidões;
Saibam que não há falsidades
Nem erros nestes conselhos:
É da boca dos velhos
De onde saem às verdades...
Ninguém se sinta ofendido.
Pois a ninguém incomodo,
E se canto deste modo,
Por encontrá-lo oportuno,
Não é para mal de nenhum
Senão para o bem de todos.
José Hernández
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