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quarta-feira, 16 de setembro de 2009

ImportaRSE - Florianópolis

A RSE frente à síndrome Harry Lame
Setembro 15 de 2009 – Autor: Josep Maria Lozano

Em novembro de 2008, a Rainha pediu à London School of Economics alguma explicação ante o surpreendente fato de que praticamente nenhum economista tivera previsto a crise financeira ou, como se costuma dizer agora, a crise. Provavelmente, não só a Rainha deviera pedir explicações, mas ao menos ela obteve alguma resposta. Uma das respostas que recebeu merece uma atenção detida. Propriamente, não a resposta, senão a questão que apresenta a dita resposta.
O que vem a sinalar os autores é que o grêmio dos economistas tem, ao menos, um problema. Um problema que tem a ver com a formação que recebem. Os autores qualificam dita formação de demasiado estreita, obcecada pelas técnicas e sobrecarregada de matemáticas, e sem capacidade de facilitar uma visão global das questões às que se enfrentam. Uma formação na que brilham por sua ausência a psicologia, a filosofia e a história econômica. Mais ainda. Considera não tão só pobre, insuficiente, limitada e parcial a formação que recebem, senão que ademais não facilita que os economistas revisem criticamente suas próprias crenças.
Por certo, ao falar de crenças não estão falando de religião, filosofia ou astrologia: um exemplo de ditas crenças é o que os autores qualificam como "the highly questionable belief in universal rationality nor theefficient markets hipothesis, both widely promoted by mainstreameconomists" (a crença muito questionável na racionalidade universal nem a hipótese de mercados eficientes, tão amplamente promovidas pelos economistas da corrente principal)” Como destacam em outro momento de sua carta, há dominado uma visão da economia separada do mundo real. Sua conclusão é que os modelos e as técnicas são importantes, mas que, dada a complexidade da economia global, se requer uma maior atenção ao substancial, e ter em conta também fatores históricos, institucionais e psicológicos.
Nem que dizer que comparto o núcleo do que propõem os autores. E mais se temos em conta que este ano celebramos o 50 aniversário da publicação de “As duas culturas”, o ensaio de C. P. Snow. Em dito ensaio (repito: faz cinqüenta anos) se sinala a perda que supõe a ruptura entre ciência e humanidades para nossa vitalidade social e para a capacidade de resolver os problemas que nos inquietam. Desde este ponto de vista, a crise que temos vivido (e que ainda estamos vivendo, brotos verdes à margem) pode interpretar-se também como a apoteose da fratura entre as duas culturas. E duvido muito que saigamos bem dela se a seguimos considerando só um problema técnico; de colossais dimensões, certamente, mas técnico sem mais.
E por isso discrepo dos autores da carta num ponto. Porque o problema não se reduz à formação. Sem dúvida, no mundo da economia e da empresa estamos ante uma urgentíssima necessidade de revisar o modelo formativo. Mas o problema se situa mais além. O inclui, insisto, porém vai mais além.

É um problema de mentalidade, e requer explicitar abertamente um conflito de mentalidades. Trata-se duma autêntica batalha que deve livrar-se, por utilizar a expressão de Ortega, no terreno das idéias e crenças.
E neste terreno se requer urgentemente uma terapia para uma pandemia muito mais grave que a da gripe A. Refiro-me ao que denomino a síndrome Harry Lime. Porque responde a uma atitude, profundamente arraigada, que se reflete em aquele inquietante filme (lamentável e injustamente não utilizada nas escolas de negócios) que leva por título The third man (O terceiro homem). Numa seqüência memorável, o protagonista –Harry Lime- se confronta com seu velho amigo a propósito de suas atividades e, desde o alto da nora este lhe interpela: "têm visto alguma de tuas vítimas?" Às vezes olvidamos que a responsabilidade requeira algo que vai mais além de a abstrata pergunta pelas conseqüências; requer ver às vítimas. E se algo parece claro, é que nesta crise nos temos assomado ao pavor de algumas possíveis conseqüências Mas não estou tão seguro que hajamos visto a suas vítimas. Harry Lime sintetiza em sua resposta o núcleo da síndrome que proponho que leve seu nome: "temo que não tenha visto as coisas com claridade; ninguém pensa em termos de seres humanos, por que o vamos fazer nós?". Pois exatamente isso: por quê? No mundo da economia e da empresa: que tipo de coisas vê claramente quando dizemos que algo o vê claro? Cifras ou pessoas? Desde o alto da nora, Harry Lime lhe pergunta a seu amigo: olha a todo esse pessoal aí abaixo; são meramente pontos: sentirias piedade e compaixão se qualquer desses pontos deixara de mover-se para sempre? e se te pagara por cada ponto que deixara de mover-se, renunciarias ao dinheiro? Hoje muitos presidentes e diretores gerais trabalham em despachos que se encontram – não só fisicamente a muita maior altura que a que lhe permitia alcançar a nora vienesa a Harry Lime: os pontos, conseqüentemente, são mais minúsculos.
A síndrome Harry Lime não é só uma conseqüência da fratura entre as duas culturas. É a expressão duma mentalidade que empapa certo espírito de nosso tempo. Uma mentalidade que se traduz em práticas e decisões, mas que se sustentam em crenças, valores e atitudes profundamente arraigados, ao que não queremos questionar e por isso, ao final, não nos cabe outra coisa que lamentar-nos. Crenças, valores e atitudes que só vêem cifras e pontos que se movem. Não vêem pessoas, nem contextos, nem biografias, nem culturas. E a esta cegueira às vezes a chamam pomposamente e cinicamente capacidade de tomar decisões! Ultimamente se há posto de moda rasgar-se as vestimentas ante a constatação de que voltem os magníficos bônus ao setor financeiro, incluso em organizações salvas graças às injeções públicas. Como não vão a voltar se só temos querido evitar o desastre, mas não trocar, questionar nem reformular nada! Só temos aspirado, a voltar. Só temos aspirado, a voltar à normalidade.
Por isso a RSE é algo mais que técnicas, métodos ou ferramentas de gestão. É – deve ser algo mais. É uma terapia de choque para a síndrome Harry Lime. Mas não é só uma terapia. É também uma peça de uma batalha de idéias, mentalidades e atitudes. Uma batalha eminentemente prática, mas que se livra também – e sobre tudo - no terreno das idéias, as mentalidades e as atitudes. Uma batalha econômica e empresarial, mas que se arraiga num compromisso desde a cidadania e pela cidadania.
Porque, em último termo, é em tanto como cidadãos que devemos clarificar nossa postura ante a síndrome Harry Lime. E não esqueçamos que, no filme, o próprio Harry Lime não admite meios termos

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